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Carta a kardec

Rio de Janeiro, 03 de outubro de 2022

Adilson Gomes e Iliana Quelhas

Querido Kardec,

Outubro é o seu mês. Em todas as Casas Espíritas de várias partes do globo, você está sendo homenageado pela data de seu nascimento. Já se passaram exatos 218 anos. Como é do seu conhecimento, naquela época, a Europa estava impregnada de ideias libertárias do pensamento Iluminista, movimento cultural europeu que se desenvolveu especialmente na França, nos séculos XVII e XVIII. Apesar de envolver diversas tradições filosóficas, religiosas e intelectuais, esse movimento sintetiza de forma singular as tendências comuns centradas na busca do progresso e da perfeição humana. 

O Iluminismo enaltece o exercício pleno das capacidades humanas. O pensamento racional torna-se, assim, o meio de compreensão do mundo capaz de superar o domínio das superstições, das crenças e dos dogmas da religião, predominantes nas ideologias tradicionais. Tinha como lema libertar os homens, que viviam nas “trevas da ignorância”, da sociedade do antigo regime. Tudo que não passasse pelo crivo da lógica racional era descartado como inútil ao crescimento humano e social. Negava-se qualquer atividade e instituição que não fossem racionais, como a fantasia, os sentimentos, as paixões, a religião, o transcendente, enfim, a subjetividade de uma forma geral. Instituiu-se a religião humanista, cuja deusa razão reinava neste mundo e nesta vida terrena. Nada escapava do domínio das trevas do materialismo. Paradoxalmente, essa maneira de pensar e agir herdada do século XVIII, Século das Luzes, criou uma nuvem espessa de incredulidade sobre a Terra, tornando permanente a noite da ignorância espiritual entre os homens. O eclipse do Evangelho carecia de uma nova luz que libertasse as almas prisioneiras das ilusões materiais.


Nesse cenário histórico-social, reencarnaste em 03 de outubro de 1804, vindo à Terra como mensageiro de Jesus, com a missão sublime de ser o coordenador de uma falange de espíritos, encarnados e desencarnados, para codificar a Doutrina Espírita. Vieste trazer a luz do amor e da fraternidade, despertando a esperança consoladora para milhões de almas vítimas do fanatismo, da tirania, das superstições e da ignorância sobre a vida futura. Seu ministério fez reviver a prática do primitivo apostolado cristão, simples e puro, numa época caracterizada pelo medo, pelo terror e pelas guerras. Lembra-se? As relações sociais entre os homens regidas pela “voz da razão” parecem ter ficado na defensiva durante esse tempo todo. Basta contabilizar o que produziu com guerras, deportações étnicas, terrorismo e outras barbáries. Por intermédio de sua liderança catalisadora, Kardec, o Cristianismo retoma o papel libertador junto às criaturas subjugadas pelos mantenedores da fé cega e do obscurantismo da tradição. 

Nos dias de hoje, meu caro amigo, podes ter a certeza de que os seus esforços não foram em vão. A Doutrina Espírita não foi ultrapassada. Continua tendo consistência. Os seus princípios básicos continuam válidos, apesar de todo o avanço do conhecimento humano ocorrido desde o seu nascimento. Novos frutos de origem humana e espiritual têm sido gerados nos ramos da árvore Espírita, porém suas raízes cada vez mais se solidificam no solo da fé raciocinada. Desses frutos, muitos sob a forma de livros, nenhum deles substituiu as obras codificadas por ti sob a inspiração permanente dos Espíritos Superiores. O mais importante de tudo isso, é seguirmos o seu exemplo em não nos deixar influenciar por concepções preconcebidas, assumindo o espírito científico, com senso crítico, prudência, paciência, seriedade e, acima de tudo, humildade e respeito com as ideias contrárias às nossas.


Vale a pena lembrar suas principais obras, principalmente para aqueles iniciantes no Espiritismo: “O Livro dos Espíritos”, compêndio de filosofia espírita, cuja primeira edição apareceu a 18 de abril de 1857; “O Livro dos Médiuns”, referente à parte experimental e científica que foi publicado em janeiro de 1861, “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, que surgiu em abril de 1864; “O Céu e o Inferno” (agosto de 1865); “A Gênese, os Milagres e as Predições”, (janeiro de 1868); “Revista Espírita”, periódico mensal começado a 1 de janeiro de 1858; ainda publicou “O Principiante Espírita” e “O que é o Espiritismo”.

Nesses tempos modernos, a mensagem universal de Cristo transmitida pelo Espiritismo, apesar de ainda mal compreendida e praticada, continua atual e tão, ou mais, necessária do que na época dos Apóstolos. Sendo coerentes com a nossa doutrina, temos acompanhado as novas teses espíritas, os novos pensamentos, as novas descobertas científicas. No entanto, em nenhum momento deixamos de comparar o novo com a espinha dorsal da Doutrina Espírita, a Codificação Kardequiana.


Fique tranquilo! Os anos não apagaram a sua construção, alicerçadas em bases muito sólidas, sob a direção do Espírito de Verdade.

Todos nós leitores dessa singela homenagem estaremos orando por ti e agradecendo o seu legado.

 

Dois espíritas aprendizes.


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